A Ascensão de Diana

Na sexta-feira eu fui ao balé. Digo que, posso ter, ou me senti por algum momento na primeira cena de “Hable com Ella” de Pedro Almodóvar (2001). Na ocasião não assisti “Café Müller”, tão pouco vi Pina Bausch, mas sim, eu tive outro encontro profundo e muito determinante.

Minha sexta-feira foi intensa como de costume. Sou intenso, e pessoas que não são intensas tem uma dificuldade tremenda para entender a intensidade dos intensos. E nós intensos temos uma dificuldade tremenda para entender as pessoas que nos soam mornas.

Eu tive um encontro que talvez estava relutando em ter por conta de um dia demasiadamente adulto. Porém minha Perpétua / Ismênia veio até mim e fomos ao balé. Eu me deparei com uma obra linda, mas os corpos em cena, as luzes, os gestuais me levaram para outro lugar, um lugar de doze anos atrás.

Antes da regressão devo advertir a você, que me lê, que mais uma vez me sinto como Poncela. Eu novamente me iludo, e finjo que meu teclado preto é a máquina de escrever azul de “La Ley Del de Deseo” de Pedro Almodóvar (1987).

Eu vi em cena, baixo a luz âmbar um dos fantasmas sexuais de Diana, eu posso ter me enganado, não era apenas uma representação, era sim um dos fantasmas sexuais de Diana.

Há doze anos atrás eu resolvi brincar, dei a Diana, a deusa sagrada da caça, representada pelos chifres do cervo, casta, ares profanos de Afrodite. Pensava eu na época que todo corpo profano odiado pela massa, era na verdade o corpo mais desejado. O corpo mais comungado, mesmo que no escuro.

E assim nasceu Diana, meu último filme de roteiro. Diana era todo o desprezo que há doze anos atrás eu nutria pelo meu ser, pelo meu corpo.

Como uma criança peralta e desavisada das consequências, eu, tão só eu, e realmente muito só, decidi brincar com meus traumas.

Diana é tão suja como sua estética, Diana é a concretização do meu trabalho artístico que venho arrastando por encarnações.

Naquela época aos meus vinte cinco anos, o plano de um curta metragem se transformou em uma edição de um longa-metragem, de nome “Diana – Tudo ou Nada”. Composto por imagens de Diana agonizando, de Diana morrendo de medo dos seus fantasmas sexuais, que foram no filme personificados por belos corpos de jovens rapazes.

Em 2010 eu havia assistido “That Man: Peter Berlin” de Jim Tushinski (2005), e absorvi todo o nojo pelo sexo que Peter desenvolveu no auge da AIDS na Nova York dos anos 80. Era eu uma cabecinha cheia de referências, mas muito confusa.

Dentro das experimentações de Diana eu fiz cenas de um animal ferido, e sequências de uma banana apodrecendo no canto. E na realidade quem estava ferido, e apodrecia era eu.

Na mesma época de Diana, também rodei o curta-metragem “Sobre Dória” um roteiro que tinha escrivinhado dez anos antes. Dória ganhou vida, Dória foi para frente – ao que pese que hoje não posso exibir o filme, pois não tenho os seus direitos autorais. Mas Diana foi me aterrorizando, me envenenando e eu não pude concluir sua edição.

Ass: Laura P.

Não terminei Diana e fui embora para Curitiba, enquanto escrevo este texto revelador, eu escuto “At Last” na voz de Etta James, porém não me consumo com cervejas baratas e cigarros como faria na época de Diana.

Diana morreu em 2010, mas deu vida ao meu momento mais emblemático como artista, o “Carne de Açougue”. Toda a confusão e pulsação que adquiri no processo de Diana se transformou em uma série de vídeo-artes, desenhos e performances cujo tema central era apenas o desprezo a mim mesmo.

Eu tive que matar Diana, tive que degolá-la com minhas próprias mãos, e após seu último suspiro disparei contra Diana 7 tiros mortais em seu peito. E só assim saí desta fase, só assim veio “Mudos Possíveis” e agora “7” que utilizo como meu Talismã. Eu pedi minha licença: “Deixa-me Matar”.

Na época eu propus ao interlocutor que passasse a odiar Diana, pois ela merecia… Fomos tão odiados… Eu e Diana um par ensandecidamente complementar.

Volto aqui, aos dias de hoje, no momento em que meu corpo eternamente profano sentou-se na cadeira do teatro e se apavorou ao rever Diana no balé. Um belo trabalho, e um corpo, um fantasma que me atravessou.

Não pensem que Diana é uma diaba, não. Diana foi, e é, e sempre será a deidade, que me deu permissão para reencarnar vivo nesta existência, pela primeira vez em milhares de anos. Diana é o meu eu do futuro.

Agora me sinto tocado como por um beijo divino, e bem acolhido no meu recente reencarnio, que se iniciou apenas há quatro anos. Sou uma criança cósmica, com uma constelação na barriga, dando as mãos para Emmanuel que está me guiando para a quinta dimensão.

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