O Moço da Vitrine

No ano de 2005, há quase exatos 19 anos, organizei o primeiro evento em homenagem a Pedro Almodóvar da minha vida.  O Ciclo Pedro Almodóvar, que durou uma semana, e ocorreu no antigo Café Filósofo, no Shopping Contour em Londrina.  O Contour, por si só, tem história. Ele é considerado o primeiro shopping do sul do país, edificado em um formato que mais lembra uma galeria de rua. Sua arquitetura modernista e a logomarca setentista, na época, me transportavam para um tempo que eu nunca vivi.

Como tudo que faço, o evento era aberto por uma ambientação, abrilhantada com um manequim vestindo um look cafona. Na ocasião, eu estava sozinho arrumando a vitrine do Café quando no vidro bate um moço bonito, não era muito alto, mas tinha braços fortes e olhos claros.  O moço também era dono de um jeito estranho, psicótico e envolvente. Aquele foi nosso primeiro encontro. Na época, vivia meu primeiro namoro gay, e sentia que a relação tinha tempo determinado, por uma situação que já vivi em outros momentos, que é estar com alguém muito especial, mas que tentava me impor limites. E não sou o tipo de pessoa que se limita, mesmo que já tenha incorrido no erro de tentar impor limites em outros namorados, não esse, ou outros que não me limitaram, mas sim nos que me deram espaço.

Esse relacionamento com os dias contados fez com que essa atração pelo moço da vitrine aumentasse. O moço era estudante, acredito que de jornalismo, viu sobre o evento na Folha de Londrina e foi até o Café para fazer uma entrevista com o organizador do evento, eu, no caso. Meu namorado da época também era um dos organizadores do Ciclo, uma mente brilhante, inclusive, mas, alguém bem menos vaidoso e aparecido que eu. Bom, fizemos a entrevista.

Em determinado momento esse moço passou a fazer parte da minha vida. Ele tinha o sonho de fazer um filme, e eu também.  Deus, esse sonho era algo tão distante na época.

Certa noite, fomos juntos a um espetáculo, “Bricolagem”, nunca vou esquecer dessa noite, pois esse espetáculo ajudou a criar meu plano estético como artista visual. Na ocasião, o moço levou sua “melhor amiga”, e ali se anunciou uma inimiga, talvez, na época. A amiga era apaixonada pelo moço, e talvez eu era um empecilho na vida dela. Eu realmente não sabia o que sentia pelo moço. Na volta do espetáculo, andamos sozinhos na rua, sem a amiga.  Encontramos no chão um caderno com muitas anotações, claro que levamos para casa, pois era, na ocasião, o objeto do argumento do nosso filme. Quem era o dono ou dona do caderno? Essa personagem, ao meu ver, morava no prédio em cima do centro comercial, ao lado da concha acústica de Londrina. O edifício em questão me remetia a um cenário de Almodóvar.

Em uma tarde juntos em casa, o moço voltou do banheiro sem camisa, nada aconteceu, mas eu fiquei transtornado. Quase na sequência, o moço sumiu da minha vida, porém sua amiga ficou por mais um tempo, e teve a oportunidade de realizar suas vilanias para compensar os seus ciúmes.  Em resumo, nem eu e nem ela, ficamos com o moço. Tampouco eu e o moço fizemos nosso filme.

Nessas férias, entrei em uma livraria e esbarrei com o moço, ele sorriu e eu senti que o tempo não passou.

Foi nesse roteiro almodovariano que ocorreu o 1º Ciclo Pedro Almodóvar em 2005. Hoje, quase 20 anos depois, rendo homenagem a esse momento, e trago a Curitiba, no Luar da Baronesa, o 2º Ciclo Pedro Almodóvar. Evento produzido por Edson Godinho e Rossana Kurscheidt. Uma tarde muito especial, com direito a vitrine e exposição temática, e exibições de filmes, no dia 3 de fevereiro, sábado. Nossa casa será aberta às 12h para visitação e as exibições começam às 13h. Cada exibição comporta apenas 10 pessoas, pois os filmes serão transmitidos em TV de Tubo como no ano de 2005.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *